Com o fim da ditadura militar e sob a chamada “Nova República” de José Sarney (1985-1990), o padrão de acumulação –apoiado no tripé dos setores produtivos do estado, capital nacional e capital internacional– começou a sofrer as primeiras modificações. Embora seus traços genéricos mantinham-se ainda em vigor, se iniciaram mutações organizacionais e tecnológicas no processo produtivo e de serviços, embora a um ritmo muito mais lento do que as experimentadas pelos países centrais, que viviam intensamente a reestruturação produtiva do capital e seu corolário, ideopolítico neoliberal. Com tudo, a singularidade brasileira começava a sentir os efeitos dos traços universais emergentes do sistema global do capital, que rediseñaba uma particularidade que pouco a pouco foi se diferenciando da característica da fase anterior, a princípio, apenas em alguns aspectos e, em seguida, em muitos de seus traços essenciais.
Foi durante a década de 1980, quando foram gerados os primeiros impulsos para a reestruturação produtiva que conduziu à adopção por parte das empresas, no início de forma limitada, de novos padrões tecnológicos e de ordenamento como formas renovadas de organização social do trabalho. Iniciou-Se, assim, a informatização produtiva e a utilização do sistema just-in-time2; germinó da produção baseada no team work, assente em programas de qualidade total, e ampliou-se também a difusão da microeletrônica.
Também começou a implantação dos métodos denominados “participativos”, mecanismos que procuram “envolver” (ou melhor dito, para obter a adesão e a sujeição) dos trabalhadores nos planos das empresas. De modo ainda incipiente, se estruturava o processo de reengenharia industrial e organizacional, cujos principais determinantes foram consequência dos seguintes fatores:
- a) as imposições das empresas transnacionais, que levaram a que as suas subsidiárias no Brasil a abraçar novos padrões tecnológicos e de organização inspirados, em maior ou menor medida, o toyotismo e as formas flexíveis de acumulação;
- b) a necessidade de as empresas brasileiras, no domínio do capital e de seus novos mecanismos de concorrência, de se preparar para a nova fase, marcada por uma forte competitividade internacional”3;
- c) a necessidade de as firmas nacionais de responder ao avanço do novo sindicalismo e das formas de confronto e rebeldia dos trabalhadores, que buscavam estruturar com mais força nos locais de trabalho, desde as históricas greves da região industrial do ABC4 e da cidade de São Paulo, depois de 1978.
Mas foi a partir de 1990, quando a reestruturação produtiva do capital brasileiro intensificou-se, em um processo que vem afianzándose sob formas diferenciadas, e que configura uma realidade que abrange tanto elementos de continuidade como de descontinuidade em relação às fases anteriores.
Nossa pesquisa mostrou que, hoje, existe uma nítida mistura de elementos do fordismo, que ainda têm uma marcada vigência, e elementos próprios das novas formas de acumulação flexível, ou de influências toyotistas, que também são por demais evidentes.
Na atual fase do capitalismo brasileiro, combinam-se grandes reduções da força de trabalho com mutações sociotécnicas no processo produtivo e na organização do controle social do trabalho. A flexibilização e a desregulamentação do trabalho, bem como a terceirização e as novas formas de gestão da força de trabalho implantadas no espaço produtivo, manifestam-se com grande intensidade, em coexistência com o fordismo, que parece ser conservados ainda em vários segmentos produtivos e de serviços.
Mas ao observar o conjunto da estrutura produtiva, também se pode constatar que o fordismo periférico e subordinado estruturado no Brasil, se mistura cada vez com mais força com os novos processos produtivos, em grande expansão, como consequência da liofilização organizacional5 dos próprios mecanismos originários da acumulação flexível e das práticas toyotistas equiparadas com vigor para o setor produtivo brasileiro.